terça-feira, 4 de maio de 2010

CHEFES ESPIRITUAIS

(Daniel 10.1-21)
Esta parte do livro não é mais do que a introdução à mais extensa profecia das Escrituras, ou seja, compreendendo desde o tempo histórico do profeta até ao fim do tempo ou, melhor dizendo, até ao tempo do fim. Assim, a profecia, propriamente dita, iremos encontrá-la na próxima lição - o capítulo 11 – e, tal como dissemos, o capítulo 10 não é mais do que o seu prólogo, enquanto que o capítulo 12 é o seu epílogo.
Nesta visão Deus vai levantar a cortina da História para mostrar a este Seu servo algumas realidades do mundo invisível, ou seja, o conflito entre as forças do mal contra as do bem.

1- Um grande conflito
v.1 - Este capítulo abre situando o leitor num tempo histórico bem preciso, ao longo do qual se desenrola “uma guerra prolongada”. Esta revelação do alto teve lugar no “terceiro ano de Ciro” - 536/5 a. C. - ou seja, dois anos depois do quanto é relatado no capítulo 9.
Muitos anos são decorridos desde que o profeta Daniel saíra de Jerusalém para Babilónia. Agora o profeta já não tinha o mesmo vigor de outrora, pois a sua idade, nesta fase, rodava os 90 anos, o que, de certa forma era um obstáculo que o impediu de acompanhar o povo de Deus de volta a Jerusalém. A alegria anterior dava agora lugar a uma certa angústia, visto que não só aqueles que regressaram como também os que se propunham reconstruir o templo de Jerusalém, localmente encontraram uma feroz resistência dos habitantes locais, ao ponto destes últimos serem tidos como “adversários de Judá e Benjamim” – Esdras 4.1.
Tudo foi feito para entravar o propósito da reconstrução do templo, tal como o texto bíblico nos dá a conhecer: 1- “o povo da terra debilitava as mãos do povo de Judá”; 2- ao ponto de terem feito uso da corrupção - “alugaram contra eles conselheiros para frustrarem o seu plano” – Esdras 4.4,5.
Quando estas notícias chegaram ao conhecimento de Daniel uma grande tristeza invade o profeta, não por não ter podido acompanhar os seus pares, mas devido às notícias acerca dos trabalhos inerentes à reconstrução do templo, que não eram as mais animadoras.
Estas notícias pesaram muito no coração de Daniel e, em consequência, o profeta entrega-se à oração e ao jejum. Que melhor forma de resolver os assuntos humanos a não ser de joelhos perante o Senhor? Assim irá fazer este grande homem de Deus, pois ele sabia, por experiência própria que a oração não só era “a respiração da alma (…)” , como também “o abrir o coração a Deus como a um amigo”.

v. 2-4 – Ao longo destes versículos ficamos a conhecer, não só quanto tempo o profeta esteve em contacto mais íntimo com Deus, abrindo-Lhe o seu coração para partilhar com Aquele que tudo sabe e tudo vê, o quanto o preocupava; portanto - “(…) três semanas completas” – como também o final deste tempo de jejum e de oração, ou seja, - o “dia vinte e quatro do primeiro mês”.
A referência – “primeiro mês” – é bastante significativa, pois transporta-nos para o mês de Tishri e não, como se poderia pensar de imediato, para o de Nisan (primeiro mês do calendário judaico)! Razões? Não esqueçamos que Daniel, como facilmente se compreenderá, rege-se pelo calendário babilónico. Assim, estando no mês de Tishri, o tempo invocado cobriu um ciclo muito importante da vida judaica, pois neste tinha lugar três festas, a saber:

1- Rosh ha-Shanah (celebrava-se no 1º dia do ano judaico) – Lev. 23.24
2- Yom Kippur (celebrava-se no 10º dia) – Lev. 23.27
3- Sucot (celebrava-se no 15º dia) – Lev. 23.39

Portanto, o fim destes vinte e um dias, ou seja, as três semanas” de jejum e de oração do profeta, coincide com o final desta última festa que tinha a duração de sete dias. Esta época era, sob todos os aspectos, a mais alegre do ano, pois em condições normais incluía, geralmente, uma visita ao templo de Jerusalém. Esta última festa – Sucot – recordava ao povo de Israel a sua passagem pelo deserto, simbolizando, por este facto, a esperança da terra prometida – Levítico 23.43 - e do reino de Deus – Isaías 2.2-4. É neste contexto de recordações e de súplica espiritual intensa, que o profeta de Deus irá receber a visita de um ser celestial, em resposta às suas inquietações.
Perante os problemas do profeta, recorde-se, Deus sempre teve a última palavra: 1- Em Daniel cap. 2, Deus respondeu-lhe ao mostrar-lhe o conteúdo do sonho do rei Caldeu – a grande estátua; 2- Em Daniel cap. 6, Deus lhe envia um anjo para que os leões não lhe causem qualquer dano físico; 3- Em Daniel cap. 9, Deus lhe envia a mais excelsa das Suas criaturas - o anjo Gabriel ; 4- Finalmente, no capítulo que estamos a estudar, Deus enviará, desta vez, o Seu próprio Filho.
Na realidade “Deus não muda” – Malaquias 3.6; Tiago 1.17 – e, a exemplo do passado, o profeta Daniel irá receber, uma resposta à sua presente preocupação. Ora vejamo-la:

2- A visão
“E levantei os meus olhos e olhei, e vi um homem vestido de linho, e os seus lombos cingidos com ouro fino de Ufaz. E o seu corpo era como turquesa, e o seu rosto parecia um relâmpago, e os seus olhos como tochas de fogo, e os seus braços e os seus pés como cor de bronze polido; e a voz das suas palavras como a voz duma multidão” – v. 6.
A descrição mostra claramente, não somente uma cena arrebatadora, a qual apontava denunciava a presença de um ser sobrenatural. Ali estava Alguém cuja glória superava a do anjo até então enviado pelo céu – o anjo Gabriel - para esclarecer e confortar o profeta, visto que a presença deste anjo não afecta fisicamente o profeta – cf. 9.21. Os efeitos físicos da visão sobre o profeta – v. 8,16 - foram semelhantes aos que se manifestaram ao profeta Ezequiel – Ezeq. 1.28 – e a João - Apoc. 1.17. É interessante comparar o mesmo efeito com a serva do Senhor. Esta descrição da visão, o seu conteúdo, como acabámos de referir, não é exclusiva do livro de Daniel, mas também no profeta Ezequiel 1.24-28 e no livro do Apocalipse 1.13-16. Esta clara identificação deste com vestes de sumo-sacerdote. Quem era este ser celeste que ali se apresentava? Este era, efectivamente, - Jesus Cristo. O Seu traje como o de um sumo-sacerdote – Ex. 28.4; Ezeq. 9.2,11 - mostra claramente que estamos no contexto do santuário – contexto de julgamento – que serve de pano de fundo ao Yom Kippur – cf. cap. 8.
Mas de seguida, eis que surge o Anjo Gabriel para o fortalecer e esclarecer acerca das inquietações do profeta. Desde já, a significação do nome do anjo Gabriel – “Deus mostrou-se forte” é, neste contexto preciso, bastante significativa pois no horizonte próximo vislumbra-se uma guerra – v. 13. Esta é entre Deus e Babel. Nesta guerra, o anjo de Deus, Gabriel, é a garantia do início da vitória. E, por duas vezes – v. 13,21- o discurso do anjo conclui com uma referência à entrada de Miguel, o príncipe celeste, na batalha. O “filho do homem” do cap. 7.13 – o “príncipe do exército” do cap. 8.11 – é o mesmo personagem que este homem/Deus que resplandece extraordinariamente e que, tal como nos foi mostrado, deixou desfalecido o profeta. Sim, este chefe é um desafio para os adversários e o garante da certeza da vitória. Mais abaixo voltaremos a falar desta entidade celestial.

3- O anjo Gabriel e a revelação
Daniel, ouve não o som da mesma voz da visão, mas uma outra que lhe era familiar, do passado – a do anjo Gabriel – cap. 8.17-19; 9.21-23. As palavras revelam uma extrema segurança: - “Daniel, homem mui amado (…) não temas” – v. 11,12.
No verso 13 - “Mas o príncipe do reino da Pérsia se pôs defronte de mim (..) e eis que Miguel, um dos primeiros príncipes veio para ajudar-me (…)”. Aqui encontramos um breve vislumbre da luta invisível entre as entidades cósmicas – entre o Bem e mal, os anjos de Deus e as hostes fiéis a Satanás – anjos contra demónios. As Escrituras dão-nos a conhecer a realidade destes agentes – “porque não temos que lutar contra o homem, mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas, contra as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais” - Ef. 6.12.
Quem era este “príncipe das trevas” que ousou fazer face a um anjo de Deus durante todo aquele tempo descrito no versículo do livro de Daniel, ou seja, “vinte um dias”? Não era outro a não ser uma entidade celeste que se identificava com o império Persa, ou seja, um anjo mau, contrário a Deus – cf. II Ped. 2.4. Por outro lado, o próprio Jesus identificou diversas vezes Satanás como sendo “príncipe” – cf. João 12.31; 14.30; 16.11. Assim, neste contexto cósmico, este príncipe não é, textualmente, o rei do império Persa, mas sim, segundo a tradição teológica - “anjos protectores dos respectivos povos”. Pois, um deles, como é dado a conhecer representa o príncipe da Pérsia – Dan. 10.13 – enquanto que outro representa o da Grécia – v. 20. Portanto, eram anjos ao serviço de Satanás, os quais contrastavam com Miguel, que dirige e orienta o povo de Deus.
Estes seres celestes, comissionados por Satanás, visavam influenciar as mais altas autoridades Medo-Persas para que não fossem favoráveis ao povo de Deus. Mas, ao mesmo tempo, anjos de Deus trabalhavam no interesse dos exilados. Assim, longo destes “vinte um dias” Gabriel lutou contra estes poderes das trevas. E, antes que a contenda chegasse ao fim, eis que Miguel vem em auxílio do Seu anjo.

4- Miguel
Na origem da grande controvérsia celeste está o combate travado no céu e revelado em Apoc.12.7-9 – onde os anjos revoltosos contra Deus são expulsos do céu, por Miguel e os Seus anjos. Esta é uma entidade superior, divina – o arcanjo Miguel – Judas 9; II Tess. 4.16; Dan. 10.21; 12.1.
Miguel (mi-ka-el) significa :- quem é como Deus. Expressão que se aplica também ao Deus de Israel – Ex. 15.11; Salmo 35.10; 71.19; Miqueias 7.18.
Esta personagem mencionada pelo profeta Daniel que, como vimos, é identificada como sendo “um semelhante ao Filho do homem” – Apoc. 1.13 - com “olhos como chama de fogo” – Apoc. 1.14 – aquele que é “o primeiro e o último” – Apoc. 1.17; 22.13 – é o mesmo do qual se diz: - “Ora vem, Senhor Jesus” – Apoc. 22.20
Tal como dissemos, desde o início, este capítulo que agora se fecha não é mais do que a introdução ao quanto vem descrito no capítulo a seguir, mostrando os acontecimentos que se desenrolarão ao longo do tempo do fim e do fim do tempo.
Esta grande visão para lá do quanto a vista e percepção humana alcança, mostra claramente que, nesta guerra cósmica com reflexos nesta terra, Deus tem, como sempre teve, a última palavra – palavra de esperança para todo aquele que n’Ele confia.

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